Brasil registrou aumento de 42% na compra de armas novas

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Fonte: O Globo

O número de aquisições de novas armas no Brasil aumentou 42% em 2018. É o que revela o 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta terça-feira (10/9) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Se em 2017 os brasileiros registraram 138.132 novas armas, no ano passado o número saltou para 196.733. Sergipe é o estado que encabeça o ranking, com 36.223 equipamentos, seguido por Rondônia (27.587), Santa Catarina (16.396) e Goiás (12.141). Rio de Janeiro e São Paulo aparecem em 6º e 12º lugar, respectivamente, com 10.012 e 5.910 armas a mais em circulação em 2018.

Entre as 196.733 novas armas adquiridas em 2018, mais de 75% (149.042) foram registradas pelo Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), banco responsável pelo cadastro de armas via Exército Brasileiro, segundo o anuário. Pelo Sigma, só podem pedir autorização para registro do equipamento atiradores desportivos, colecionadores, caçadores, militares das Forças Armadas, além de clubes de tiro.

Novas armas registradas no País

O restante, apenas 47.691 (24%), foi registrado via Polícia Federal no Sistema Nacional de Armas (Sinarm), responsável pelo controle de armas de fogo em poder da população. O registro, a posse e a comercialização de armas de fogo e munições no Brasil obedecem à lei 10.826, de dezembro de 2003, atualizados pelos recentes decretos publicados pelo presidente Jair Bolsonaro.

– Não tenho dúvidas em dizer que a difusão das armas de fogo e a política do ‘liberou geral’ serão uma tragédia para o Brasil. Uma arma de fogo em circulação dura 30, 40 e 50 anos se tiver em bom estado de conservação. O ‘liberou geral’ significa que a onda de queda de homicídios pode ser revertida em alguns anos e podemos voltar a trilhar uma escalada da violência como assistimos nas décadas de 1980 e 1990, que serviu como freio a essa corrida armamentista – Daniel Cerqueira, membro do Conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Indícios de deturpação

Para Ivan Marques, especialista em segurança pública e membro do Fórum, o salto nos registros de novas armas no país via Exército e Sigma é visto com preocupação, uma vez que há “indícios de deturpação” da forma como as pessoas estão conseguindo ter acesso a armas.

— Será que as armas realmente foram adquiridas por colecionadores ou estão sendo usadas para esportes como tiro, ou para caça? Me parece um número exagerado. Há uma proliferação de falsos atiradores e falsos atletas que se valem desse subterfúgio para circular com armas de fogo de forma mais fácil.

Os dados do anuário mostram que a aquisição de armas via Sinarm passou de 42.387 em 2017 para 47.691 em 2018. Já no Sigma, o boom é muito maior: saltou de 95.745 em 2017 para 149.042 em 2018 — 55,7%. Do total, há quase 60 mil (40%) cadastrados como atiradores desportivos, colecionadores ou caçadores. Os demais são referentes ao armamento da Polícia Militar, ao próprio Exército, agentes penitenciários e membros do Ministério Público.

— Há uma percepção de que é mais fácil conseguir registrar a arma pelo Sigma justamente pelo envolvimento dos clubes de tiro. Se há uma tese de que as pessoas estão procurando um clube de tiro para ter acesso a armas de fogo, há um desvio de finalidade. E como vamos fiscalizar isso? Hoje, essa fiscalização pelo Exército não é eficiente, pois não há braço nem estrutura para fiscalizar —, critica Marques.

Entre as 47.691 armas adquiridas via Sinarm/Polícia Federal em 2018, 35.758 foram para pessoa física, 5.337 para segurança privada, 4.418 para órgãos públicos, 1.689 para segurança pública e 120 para lojas de armas.

Em paralelo ao crescimento no número de registros de armas no país, aumentam também as ocorrências relacionadas ao porte e posse do equipamento. Segundo o 13º anuário, houve um salto de 7,5% nas ocorrências do tipo no Brasil. Enquanto em 2017 foram registrados 63.308 portes de armas ilegais, em 2018 esse número saltou para 68.320. São Paulo é o estado brasileiro com o maior número de posse e porte ilegal de arma de fogo, 13.935 em 2018, seguido por Minas Gerais (10.125) e Paraná (5.651).

O anuário ainda fez uma relação preocupante entre posse de armas e feminicídio no país. Segundo os dados, 24% dos crimes contra mulheres foram cometidos por armas de fogo entre 2017 e 2018. Com o aumento das armas em circulação no Brasil, segundo Renato Sérgio de Lima, diretor presidente do Fórum, as mulheres correrão ainda mais riscos dentro de casa.

— Hoje, dentro das casas, os crimes são cometidos, em cerca de 75%, com outros instrumentos. Imagina se liberar arma? Isso mostra o quão pouco baseado nas evidências é essa decisão de facilitar o acesso a armas de fogo. Você não vai proteger a pessoa do criminoso comum e vai tornar ainda mais perigosa a vida das mulheres.

Brasil ‘menos violento’

Na contramão do crescimento dos registros de armas no país, de acordo com dados do Anuário, estão os números relativos à violência no país. O levantamento aponta que as mortes violentas apresentaram uma queda de quase 11%. Foram 64.021 em 2017 contra 57.341 em 2018.

Para especialistas, independente da recente queda nos índices da violência, já existia, desde 2014, uma busca dos brasileiros por armas de fogo, ano em que houve uma forte tentativa de parlamentares em revogar o estatuto do desarmamento.

— O ano de 2015 foi um dos em que mais se vendeu armas no Brasil. A promoção do debate sobre o desarmamento faz com que a sociedade sinta mais medo e enxergue a possibilidade de se defender sozinha. É absolutamente maléfico, porque quanto mais pessoas usarem armas de fogo, maior será a dificuldade no combate ao crime, o que alimenta esse ciclo vicioso no Brasil —, explica Marques.

Os números do anuário mostram, ainda, diminuição nas apreensões de armas de fogo. Em 2017, foram 118.015 apreensões, contra 112.306 em 2018, uma queda de 5%. No ano passado, segundo os dados, foram enviadas ao Exército 110.691 armas para serem destruídas, contra 99.328 em 2017.

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