Segurança, conforto e produtividade impulsionam o avanço das “casas inteligentes” no Brasil
Apertar botões e interruptores não é mais algo tão usual no dia a dia do engenheiro José Roberto Muratori. Em seu apartamento em São Paulo, onde ele passa a maior parte do tempo desde o anúncio da pandemia, muitas tarefas já são realizadas pelo celular ou por comando de voz: o acender e o apagar de luzes, a abertura e o fechamento de cortinas e o controle de aparelhos eletrônicos, além do monitoramento dos acessos ao condomínio e ao seu escritório, situado a alguns quilômetros dali.
Casa de ferreiro, espeto de aço: Muratori é diretor executivo da Associação Brasileira de Automação Residencial e Predial (Aureside), e por isso mesmo um espectador privilegiado do grande avanço das habitações “inteligentes”. “As tecnologias que a minha geração via em filmes e desenhos animados, cinquenta anos atrás, são hoje reais”, ele constata.
Em um levantamento realizado em 2016, a Aureside estimava haver no Brasil cerca de 300 mil residências inteligentes – ou seja, com algum grau de automação para além de um portão elétrico. Atualmente, esse número varia entre 1,2 milhão e 2,2 milhões de lares, de acordo com uma projeção recente da Statista, empresa global especializada em pesquisas de mercado.
A imprecisão reflete a dificuldade de definição do objeto de pesquisa. O que, afinal, caracteriza uma casa inteligente? “O conceito vem mudando. No passado, ele se referia somente aos projetos mais completos e integrados. A movimentação do mercado e as transformações tecnológicas, contudo, exigem um novo olhar”, relata Muratori. Devido a isso, o estudo da Statista é dividido em seis segmentos (Conforto e Iluminação; Entretenimento; Controle e Conectividade; Eletrodomésticos Inteligentes; Segurança; e Gerenciamento de Energia).
O novo cenário é marcado pela difusão dos assistentes de voz, a partir de centrais de comando desenvolvidas por Google e Amazon, entre outras empresas, e pelos equipamentos Plug and Play, que dispensam instalações complexas. No que tange à segurança, exemplos são os novos sistemas de monitoramento, com câmeras IP acessíveis pelo smartphone ou pelo computador. Caso o usuário queira, as imagens desses dispositivos podem ser gerenciadas e gravadas por um NVR (Network Video Recorder), aparelho centralizador que é a evolução dos conhecidos DVRs. Em vez de cabos, a transmissão de dados se dá por internet wi-fi.
Outras tecnologias em voga são as fechaduras eletrônicas e os sistemas de portaria remota com controle pelo celular. Elas podem até ser integradas a soluções de monitoramento com reconhecimento facial, garantindo mais segurança a ambientes residenciais ou comerciais. “Uma pessoa que mora sozinha, por exemplo, pode autorizar a realização de um serviço enquanto está fora, sendo notificada ou conseguindo acompanhar a movimentação em sua casa”, explica Muratori.
Situações como essa mostram como segurança e comodidade andam cada vez mais de mãos dadas, impulsionando o interesse pela automação. “A facilidade de instalação e o barateamento dos equipamentos têm levado muita gente a adquirir câmeras IP não só para a vigilância patrimonial, mas também para monitorar à distância filhos, parentes idosos ou animais de estimação”, comenta o diretor executivo da Aureside.
Muratori repassa que o setor de automação residencial e predial não foi prejudicado fortemente pela pandemia. Como muitas pessoas passaram a ficar mais em casa, houve um direcionamento importante de investimentos em tecnologias para o lar. “Além de conforto e segurança, a produtividade passou a influir mais nos aportes em automação e conectividade. Muitos profissionais em home office precisam receber um cliente ou um fornecedor, e por vezes não podem fazê-lo em casa, com a família. Isso tem feito muitos condomínios transformarem áreas comuns subutilizadas em espaços utilitários, para reuniões ou prestação de serviços. Esses locais têm recebido projetos de vigilância e controle de acesso”, nota o engenheiro.
Com os efeitos da Covid-19 já considerados, o mercado brasileiro de automação residencial deve movimentar US$ 1,1 bilhão em 2020, segundo previsão da Statista. A estimativa é de que o faturamento cresça a uma taxa média anual de 22% até 2025, quando alcançará US$ 3,1 bilhões. Tal cifra fica distante até mesmo do tamanho atual dos maiores mercados mundiais para casas inteligentes, Estados Unidos e China. Cada um deles deverá alavancar, neste ano, receitas de cerca de US$ 25 bilhões. No entanto, esses países são casos à parte, e o Brasil ocupa boa posição no cenário global: é a 11ª maior praça para a automação do lar.
Tomando-se a estimativa da existência de pouco mais de 60 milhões de residências no Brasil e o cálculo mais otimista, de 2,2 milhões de domicílios com sistemas automatizados, o potencial para crescimento é enorme. Graças a produtos mais acessíveis e de instalação e operação cada vez mais intuitivas, o futuro é sorridente para as casas inteligentes. O representante da Aureside entende que a simplificação e o faça-você-mesmo não devem ser olhados como ameaça pelos projetistas e instaladores, mas sim como tendências benéficas.
“Apesar dos apelos de marketing e da evidência na mídia, o do it yourself tem alcance limitado. A cultura brasileira é o da contratação de serviços”, avalia Muratori. “Além disso, percebemos que muitos consumidores que adquirem um sistema mais básico e o instalam por conta própria vão se interessando pelo aprimoramento dos recursos e por projetos mais complexos. Isso multiplica as oportunidades para os profissionais do mercado”, comenta o profissional.
Em meio ao crescimento do mercado, um ponto destacado pelo diretor executivo da Aureside é a oferta crescente de boas soluções por marcas nacionais. “O consumidor está se conscientizando da vantagem de adquirir produtos que seguem os devidos ritos formais e com certificações da Anatel e de outros órgãos. Os equipamentos legalizados têm preços cada vez mais competitivos, com as vantagens de garantia, assistência técnica e, acima de tudo, segurança para o lar. Produtos sem conformidade com os padrões brasileiros podem causar acidentes e muita dor de cabeça”, adverte Muratori.
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